Por Rennan Pimentel
O Sistema Eleitoral do Brasil é um modelo relativamente complexo com diferentes modelos de eleição que asseguram a representação de diversos segmentos da sociedade em eleições livres, seguras e competitivas, garantindo a manutenção da democracia. Entretanto, desde a redemocratização esse sistema é motivo de muito debate, independente do posicionamento político, justamente por ser bastante complexo e com certas lacunas em aberto. Portanto, questões como voto obrigatório, financiamento de campanhas, segurança das urnas eletrônicas, representatividade social, questões de gênero, dentre outras temáticas são frequentemente apresentadas em sessões do legislativo federal -Câmara e do Senado- com o intuito de aprimorar o sistema e promover eleições ainda mais democráticas. Obviamente, há também projetos que buscam o inverso: dificultar o acesso de grupos minoritários no ambiente político.
Assim sendo, é preciso estar sempre atento a qualquer tipo de proposta, emenda ou reforma que busque modificar o sistema já existente. Em outubro de 2021, o Congresso Nacional promulgou a Reforma Eleitoral estabelecida pela Emenda Constitucional nº 111/2021 que implica na mudança de algumas regras no Sistema Eleitoral e algumas delas já serão aplicadas a partir das eleições de 2022.
Você sabe o que mudou com a Reforma Eleitoral?
A Emenda Constitucional nº 111/2021 que estabelece a Reforma Eleitoral, apesar de ser recente, trata-se de uma junção de várias propostas já apresentadas anteriormente no Congresso desde 2011, com discussões relevantes nas Comissões da Câmara dos Deputados com o intuito de mudar certas questões no Sistema Eleitoral. Importante destacar que algumas questões problemáticas foram retiradas no texto final, como a volta das coligações e o distritão que representariam um retrocesso.
Veja agora o que mudou:
COMO FICOU COM A REFORMA: |
---|
Consultas populares/Plebiscitos |
As consultas populares sobre questões locais aprovadas pelas Câmaras Municipais serão realizadas juntamente com as eleições municipais, devendo ser enviadas à Justiça Eleitoral até 90 dias antes da data das eleições. Vale ressaltar que as manifestações de candidatos e candidatas sobre esses temas ocorrerão durante as campanhas eleitorais, sem a utilização de propaganda gratuita no rádio e na televisão. |
Fidelidade Partidária |
Os Vereadores, Deputados Federais, Estaduais, Distritais que se desligarem do partido pelo qual tenham sido eleitos, não perderão o mandato nos casos de anuência do partido ou nas hipóteses de justa causa estabelecida em lei, não sendo computada, em qualquer caso, a migração de partido para fins de distribuição de recursos do fundo partidário ou de outros fundos públicos e de acesso gratuito ao rádio e à televisão. |
Contagem em Dobro de Votos Dados a Mulheres e Pessoas Negras para a Câmara dos Deputados de 2022 a 2030 |
Os votos dados a candidatas mulheres ou a candidatos negros para a Câmara dos Deputados nas eleições realizadas de 2022 a 2030 serão contados em dobro, para fins de distribuição dos recursos do fundo partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) – também conhecido como fundo eleitoral. Vale ressaltar que essa contagem em dobro será aplicada uma única vez (no caso se mulher ou negro, não acumula se a candidata for mulher e negra) |
Federações Partidárias |
A Lei 14.208/2021 institui as federações de partidos políticos, possibilitando dois ou mais partidos políticos se reunirem para constituir a federação, que, após sua constituição e respectivo registro perante o Tribunal Superior Eleitoral, atuará como se fosse uma única agremiação partidária. As regras para a criação de federação são as seguintes: a) a federação somente poderá ser integrada por partidos com registro definitivo no Tribunal Superior Eleitoral; b) os partidos reunidos em federação deverão permanecer a ela filiados por, no mínimo, 4 (quatro) anos; c) a federação poderá ser constituída até a data final do período de realização das convenções partidárias; d) a federação terá abrangência nacional e seu registro será encaminhado ao Tribunal Superior Eleitoral. Aplicam-se à federação de partidos todas as normas que regem as atividades dos partidos políticos no que diz respeito às eleições, inclusive no que se refere à escolha e registro de candidatos para as eleições majoritárias e proporcionais, à arrecadação e aplicação de recursos em campanhas eleitorais, à propaganda eleitoral, à contagem de votos, à obtenção de cadeiras, à prestação de contas e à convocação de suplentes. |
Posses do Presidente e Vice-Presidente da República e de Governadores e Vice-Governadores a partir de 2026 |
As datas de posse do Presidente da República e Vice-Presidente da República foram alteradas para 05 de janeiro, e dos Governadores e Vice-Governadores, para 06 de janeiro do ano subsequente às respectivas eleições. |
Como podemos ver as mudanças ocorridas na Reforma Eleitoral de 2021 que prometiam ser uma grande transformação no Sistema Eleitoral não foi não revolucionária assim. Entretanto, há de se destacar a conquista da contagem em dobro de votos dados a mulheres e pessoas negras para a Câmara dos Deputados de 2022 a 2030 para fins de distribuição dos recursos do fundo partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha. Tal medida é importante, pois busca ampliar a entrada de mulheres e negros no espaço político. Já existia uma cota de 30% de candidaturas de mulheres para cada partido, entretanto, as mulheres apenas tinham suas candidaturas inscritas para preencher a conta e não possuíam qualquer apoio para serem eleitas, onde muitas vezes eram até candidaturas de “fechadas”. Agora com essa nova regra, os partidos passarão a investir mais em candidaturas de mulheres e pessoas negras, uma vez que o voto deles contarão em dobro no acesso de recursos públicos para partidos e para as campanhas.
Vale destacar, por fim, que os modelos de sistema eleitoral são sempre objeto de muito debate, isso é fruto da própria natureza da democracia representativa. Sendo assim, pode-se dizer que logo após as eleições deste ano, tais mudanças serão novamente debatidas. No Brasil, contudo, os debates sobre aprimoramentos do Sistema Eleitoral costumam ser feitos de modo açodado pelos partidos e pelo Congresso e muitas vezes as mudanças na legislação costumam ser muito frequentes, são revistas sem que haja tempo para analisar e avaliar de forma concreta seus reais efeitos. Um exemplo disso é a cláusula de barreira* instituída em 2018 e que foi alvo de diversos setores nos últimos quatro anos. Felizmente, essa regra foi mantida e poderemos analisar seus impactos no sistema partidário em duas eleições (2018 e 2022).
No mais, pode-se ressaltar que as eleições deste ano são um momento decisivo para o rumo da democracia e o sistema eleitoral estará no centro desse debate. O pleno exercício das eleições e o respeito ao resultado das urnas como decisão soberana do povo fortalecerá tanto a democracia, bem como o sistema eleitoral.
*Cláusula de barreira é um dispositivo legal que restringe ou impede a atuação parlamentar de um partido que não alcança um determinado percentual de votos.
Sobre o autor
Rennan Pimentel é Mestrando no em Sociologia e Antropologia na UFRJ, graduando de licenciatura em Ciências Sociais pela UFRJ e bacharel em Relações Internacionais pela UNESA/RJ. Pesquisa sobre Pensamento Social, Política e Democracia e participa do Núcleo de Estudos Comparados e Pensamento Social (NEPS) e no Núcleo de Estudos sobre a Democracia Brasileira (NUDEB), ambos no IFCS/UFRJ.