Texto publicado originalmente no LinkedIn
Sei que estou pisando em campo minado. As emocionadas discussões de internet nos impedem de colocar algumas questões em evidência, mas desde que fundamos a BaseLab somos questionados: o que é progressismo para vocês?
Falar em “campo progressista” causa, muitas vezes, uma grande confusão, pois existem vários entendimentos sobre o termo. Algumas pessoas usam como sinônimo de esquerda e há quem, como eu, vê o campo mais ao centro, desde que democrático, como aliado.
Como uma das missões da BaseLab é justamente ser referência para campanhas e mandatos progressistas, resolvi falar a respeito sobre as múltiplas visões sobre o tema.
Colem!
O progressismo pode ser considerado um antônimo para o conservadorismo, ideia de que os valores hierárquicos e patriarcais devam ser preservados. Sendo, então, o objetivo do progressismo buscar avanços sociais e políticos alinhados com o espírito do tempo.
Norberto Bobbio, em Dicionário de Política Vol. 1 (1983), escreveu que o seguinte:
Progressismo se foi construindo baseado em três hipóteses fundamentais: a científica, que fez das ciências naturais modelos a imitar no desenvolvimento das ciências humanas e do próprio homem; a democrática, que viu na extensão do poder de decisão política a todos os indivíduos o melhor resultado a que se poderia chegar; a histórico-materialista, que fez da luta de classes o pré-requisito do necessário progresso humano.
A ideia progressista surgiu lá no século 18 com o Iluminismo, movimento burguês defensor do rompimento com as monarquias, e ao passar dos anos foi se alinhando a diferentes questões. Hoje em dia, a ideia está atrelada ao que gosto de chamar de “pautas civilizatórias” – temas que integram grupos minorizados à vida econômica e social, como feminismo, movimento negro e estudantil e assuntos LGBTQIA+. Questões estas muito caras à esquerda, embora não sejam exclusivas.
É possível ser a favor do direito das mulheres, da população gay, negros, indígenas e tudo mais o que for necessário para transformar a sociedade em um lugar melhor para todos nós mesmo não compactuando com todos os valores de esquerda, sobretudo na visão econômica. Sendo assim, considero que integrantes do centro democrático podem ser, sim, aliados.
Aqui é importante lembrar também que o combate à desigualdade social que não leve em conta cortes interseccionais tem uma probabilidade de não modificar o sistema político da maneira que sonhamos, mantendo estruturas violentas sempre a favor dos grupos historicamente deprezados.
Uma das diferenças mais gritante entre a esquerda e liberais é o desenrolar das soluções. Os problemas não são negados, mas têm resoluções distintas uma vez que o centro democrático tende a ser composto por liberais (nos costumes e na economia).
Cito um exemplo prático da minha explanação.
Tenho clientes filiadas a partidos tradicionais da esquerda que se orgulham de ser feministas e assim se classificam. Outras, preferem se dizer a favor do “direito das mulheres” porque sabem que para seu meio social, eleitorado e região isso faz muito mais sentido. É o caso da Andreia Rezende, filiada ao Solidariedade e eleita como a vereadora com mais votos em Anápolis (GO) na eleição de 2020.
Em três meses de mandato, Andreia já tem feito barulho no conservador interior goiano. Um dos projetos apresentados é o que ajuda vítimas de violência e assédio em bares e restaurantes. Ela também está encabeçando uma discussão de altíssimo nível sobre a volta às aulas para crianças da rede municipal, sobretudo as que não têm acesso a computadores, celulares e tablets e, ainda, estão sofrendo com a falta de merenda.
Andreia não é de esquerda (classifica-se como “de centro”), mas é inegável sua contribuição para o campo progressista e trabalho por melhorias a nível local – o que é justamente o papel de uma vereadora. Por isso acredito e defendo a ideia que o progressismo se refere ao espectro ideológico que vai um pouco além da esquerda tradicional.
Outras visões sobre o tema
Ressalto que minha posição não é unanimidade. Há quem ache que o progressismo refere-se a ideias que se oponham não só ao conservadorismo, mas também ao neoliberalismo. Neste caso, leva-se em conta que as pautas de mercado podem ser consideradas “inimigas” dos interesses populares.
Aqui na América Latina, o progressismo ficou mais evidente na virada do século 20 com a eleição de Kirchner (Argentina, 2002), Lula (Brasil, 2002), Vázquez (Uruguai, 2005), Morales (Bolívia, 2005), Correa (Equador, 2006) e Bachelet (Chile, 2006). Todos esses presidentes se consideram de esquerda, embora, sabidamente, tenham feito alianças com as elites locais e até mesmo se valido de estratégias liberais em seus governos.
Por uma aliança democrática
Sou dos que acreditam que é preciso alinhar interesses entre todos que apoiam os direitos humanos, democracia e liberdades individuais – os tais valores progressistas que encontram intersecção justamente entre a esquerda e centro democrático.
Há, ainda, indivíduos progressistas mesmo em partidos mais tradicionais. Vamos a mais um exemplo? O deputado Rodrigo Maia (DEM) não é revolucionário e nem esquerdista, mas teve uma postura muito interessante no comando da Câmara, sobretudo, no enfrentamento a Bolsonaro e para aprovação do auxílio-emergencial no valor de R$ 600 e prorrogação por alguns meses.
Defendo de forma intransigente que todos os progressistas do Brasil se unam contra os reacionários que hoje, infelizmente, comandam o país e parecem muito mais organizados para concorrer à presidência em 2022. Venho repetindo que temos um inimigo muito claro: o bolsonarismo. Uma frente ampla me parece mais do que oportuna no nosso momento histórico. É necessária.